Uma orientação para o artigo “Neurofisiologia das Emoções: pesquisas recentes”
Por Dr. Jerome Liss, MD / Tradução: Ana Tereza Coelho/ Revisão: Ana Patrícia Peixoto
Pesquisas relacionadas à neurofisiologia das emoções têm crescido nos últimos vinte anos, o que está relacionado com o surgimento de novas tecnologias no estudo em laboratório e nas neuroimagens (Tomografia de Emissão de Positrões e Ressonância Magnética Funcional).
Esse artigo irá oferecer exemplos de modelos neurofisiológicos resultantes de pesquisas em laboratórios. O objetivo será relacionar esses modelos neurofuncionais a questões clinicas na psicoterapia.
Estudantes e professores da área de psicoterapia corporal deverão ter especial interesse nesse artigo. Mas por que esse interesse? A abordagem corporal foca as emoções e outras partes da vida psicológica através de teorias e práticas que “integram corpo e mente”. Especificamente, isso quer dizer que nossa abordagem integra expressão “verbal” com expressão corporal “não-verbal” e contato. Um dos objetivos é dinamizar a vida emocional do Protagonista e favorecer uma mudança positiva (“Protagonista” refere-se ao paciente, cliente, a pessoa que nós estamos tentando ajudar e que é o dono da sua própria vida).
Portanto, além de ouvir as palavras do Protagonista, o psicoterapeuta corporal sintoniza suas próprias mensagens corporais a aquelas que vem do Protagonista: respiração, gestos, expressão facial, tom, compasso e ritmo da voz que reforçam ou modificam a compreensão explicita e intuitiva. Deste modo, na sua prática, o psicoterapeuta corporal desenvolve essa capacidade através de uma “dupla atenção”, em relação ao corpo e à mente.
O que oferece a “Neurofisiologia das Emoções: pesquisas recentes”
Como podemos entender o “processo corporal” e relacioná-lo com o “processo mental”? A seção a seguir oferece várias perguntas mais especificas que o psicoterapeuta corporal pode querer aprofundar, as quais serão respondidas no artigo: a Neurofisiologia das Emoções. No artigo que segue essa “orientação”, indiquei o pesquisador especifico cujo modelo seguimos, com o intuito de responder a essas questões.
- Qual é a conexão entre um nó emocional e um nó neurofisiológico e entre o sistema simpático e parassimpático, isto é, as duas partes do Sistema Nervoso Autônomo, que percorre todo o cérebro e o corpo? (Pesquisador: Ernst Gellhorn).
- Como é que o “aprofundamento da emoção” – que a abordagem corporal é especialmente hábil em facilitar – ajuda a desfazer o nó emocional e re-estabelecer um equilíbrio entre simpático e parassimpático? (Henri Laborit e Ernst Gellhorn).
- Quais são os cinco níveis do cérebro que constituem a via neuronal do simpático e parassimpático? (Alan Schore). Como o conhecimento dessa estrutura hierárquica neuronal pode ajudar-nos a entender doenças psicossomáticas tal como ulceras gastrointestinais bem como a “profundidade” fisiológica das emoções?
- Quais são as conseqüências fisiológicas negativas da “paralisia diante o estresse”? Especialmente quando esse estado de inibição é prolongando? (Henri Laborit).
- Como a nossa “atenção” (um foco explicito de consciência) é influenciada por nossa “ação”? Qual é a explicação neurofisiológica? Mais especificamente, como o sistema subcortical – gânglios e tálamo – interage para influenciar as áreas corticais do cérebro subjacentes à atenção? (Gerald Edelman).
- Por que uma pessoa se torna mais vulnerável a memórias mais emotivas quando está sozinha? Especialmente quando não há nenhum programa de ação?
- Como podemos explicar que certas formas de “expressão emocional ativa e comportamento positivo” podem ajudar a conter um trauma emocional? Quais vias neuronais clarificam o mecanismo?
- Como a ativação de padrões de ação dos gânglios basais aumenta a consciência naquele momento e favorece a memória no futuro? (Gerald Edelman).
- Qual é a relação entre a experiência traumática e a linguagem? Que abordagem terapêutica pode ser sugerida? (Bessel Van der Kolk).
Os Insights Obtidos pela Utilização de um Mapa Neurofisiológico do Cérebro
Enquanto a consciência é associada somente com processos cerebrais corticais – a parte superior do cérebro – nossos estados de consciência são profundamente influenciados, a todo o momento, pelos processos cerebrais que se encontram abaixo do córtex, ou seja, pelos processos cerebrais subcorticais. Dessa maneira, mensagens “não-conscientes” alcançam nossa mente consciente.
- E o inconsciente freudiano? Há divergências. Um exemplo é que experiências que podem potencialmente torna-se consciente devem ser baseadas em processos corticais. O subcórtex não tem a arquitetura suficientemente complexa para “manter” a consciência, porém o movimento de um pensamento reprimido (experiência, emoção) para um pensamento consciente pode depender das influências subcorticais. Portanto, conhecer a estrutura da dinâmica subcortical pode ajudar no conhecimento sobre a abertura do inconsciente reprimido, bem como sobre inúmeras outras dinâmicas conscientes (atenção, associação livre, memória, planejamento, avaliação).
- O conceito de “processos distribuídos” sugere que todas as partes do cérebro estão interagindo a todo o momento. Portanto, todo processo cerebral pode contribuir, potencialmente, para influenciar e alterar todos os estados mentais e todos os estados de consciência. (Isso nos permite pensar a respeito da validade de diferentes escolas psicoterápicas e suas abordagens para ajudar as pessoas).
- Podemos entender agora como uma “mudança de pensamento” é freqüentemente insuficiente para mudar uma dinâmica emocional, mesmo se acharmos que sabemos “a origem” do problema. O problema, um desequilíbrio, envolve processos de todos os níveis do cérebro, tanto quanto no corpo. Cada nível está conectado aos outros, mas tem sua própria dinâmica (Sistema Semi-autônomo). Portanto, a transformação terapêutica tem que acontecer em todos os níveis. Mais uma vez, a abordagem corporal favorece a transformação simultânea em todos os níveis.
- “Intuição” significa a entrada na consciência de um pensamento ou ação que não estava anteriormente presente, mas que parece significativa para a situação em questão. O mapa do cérebro dá suporte para a relevância da intuição. As mensagens subcorticais influenciam pensamentos e ações em curso. Assim, podem criar surpresas e modificações. O “conhecimento mais profundo” que chega ao córtex pode vir de diferentes níveis: o núcleo diencefálico da amígdala, hipocampo, tálamo e gânglios. Indo mais fundo temos o hipotálamo e a massa cinzenta central. Mais fundo, na parte inferior da ponte e da amídala (juntos, o tronco cerebral) temos os centros que produzem e distribuem para todo o cérebro quatro ativadores cerebrais básicos: dopamina, serotonina, acetilcolina e noradrenalina. E no interior do cérebro temos o núcleo solitário e o núcleo dorsal-motor do nervo vago, que serve para criar entradas e receber saídas de nossos órgãos viscerais. E então, a fonte de nossa “intuição visceral”. Todos esses processos internos do cérebro mandam mensagens “para cima”. A conclusão? Funções corticais são influenciadas e nos dão “intuição”.
- Essa dinâmica, de baixo para cima, influencia muito mais que intuição. Influencia o humor, prazer e dor, energia física e mental, capacidade de aprendizagem, prontidão para ação, conexão eu-mundo, e mais. A questão é que nossa consciência é como a espuma no topo de uma onda, que é guiada pela força da onda.
- O impacto de nossas intervenções terapêuticas (palavras, gestos e contato) sempre pode ter resultados ligeiramente diferentes das nossas intenções. E, ocasionalmente, resultados radicalmente diferentes quando nós cometemos um erro! Assim, temos de aprender através do feedback imediato, verbal e não-verbal, percebido e intuído, dado pelo nosso Protagonista. Esse dilema ontológico “Eu nunca posso saber ao certo quais resultados as minhas ações podem ter” pode nos tornar humildes e favorecer nossa sensibilidade intuitiva para com o outro.
O mapa neurofisiológico ajuda-nos a criar esse respeito para com o “interior desconhecido”, o desconhecido do Outro e o nosso desconhecido. Nossa consciência cortical passeia nas ondas da nossa dinâmica sub-cortical que está intimamente ligado com o nosso corpo. O Protagonista está na mesma condição. Nós estamos, constantemente, recebendo emoções da amígdala, das conexões self-outro e outras relações espaciais do hipotálamo, “prontidão” para a ação dos Núcleos Acumbens, ações estratégicas e rotinas dos gânglios, humores e diferentes formas de excitação dos centros cerebrais inferiores, sensações viscerais e intuições do tronco cerebral inferior, e por aí vai. Tudo isso está fora de uma conscientização. Mas não é um mito.
Portanto, a aventura psicoterápica será sempre uma aventura.
Conclusão: As orientações anteriores são apenas algumas conclusões que podem ser extraídas pelo entendimento da neurofisiologia das emoções. Estudantes e professores de psicoterapia podem formular outras hipóteses de aplicações clinicas através dos mapas neurofisiológicos, bem como, procurar outros mapas. A questão é criar uma linguagem na qual possamos compartilhar nossas idéias e métodos de modo que nossos colegas e amigos saibam do que estamos falando.