O que é Dor crônica
Por Ana Patrícia Peixoto e Ana Tereza Coelho
A dor crônica é uma dor persistente e recorrente que tem uma duração de mais de 03 meses. Pode ter múltiplas causas que variam de acordo com a origem da dor.
A Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) define a dor como uma experiência sensitiva e emocional desagradável decorrente ou descrita em termos de lesões teciduais reais ou potenciais. Essa definição tem caráter abrangente e amplo, e permite que seja englobada a vivência subjetiva e individual dessa experiência para cada pessoa.
Assim, a dor crônica vem representando um desafio para à medicina e à psicologia, devido à complexidade de seus sintomas e causas, e às limitações nos tratamentos disponíveis no momento. A boa notícia, é que psicoterapeutas, principalmente na Europa, que vem estudando o corpo e a mente como uma unidade inseparável, vem apresentando técnicas integrativas e multidimensionais com bons resultados.
De onde vem a dor?
Para responder essa complexa pergunta buscamos a definição dada pela SBED (Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor) sobre de onde vem a dor que você por ver nesse link.
A dor é um evento puramente físico?
Segundo a SBED, se olharmos para o cérebro como estrutura física, química, “líquida” e quase perfeita, a resposta seria sim! Mas, não devemos esquecer que as emoções, o ambiente que vivemos e convivemos, o movimento do nosso corpo, a forma que pensamos e agimos, a religião e cultura, e outras coisas a mais, também interferem na química dos neurônios. É essa química entre milhões de células que permitem a passagem de energia e a produção de luz.
Assim, podemos dizer que a dor vem desta interação entre o sal e o açúcar, entre a química e física. A dor não vem dos nervos, dos discos da coluna, dos ligamentos do joelho ou da pele queimada de sol.
Então poderíamos nos perguntar: se a dor vem do cérebro, desta estrutura física, será que os dias do modelo biopsicossocial estão contados?
Não mesmo, porém sem cérebro, não tem psicossocial.
A concepção da dor como um fenômeno multidimensional vêm se solidificando na prática clínica. Os modelos multidimensionais preconizados nos centros e clínicas da dor subsidiados por este conceito têm em sua prática oferecido diagnósticos e intervenções interdisciplinares eficazes.
O que faz você sentir Dor Crônica?
Esse sentimento de dor vem como uma série de mensagens em zig-zag através do seu sistema nervoso. Quando você se machuca, a lesão ativa sensores de dor naquela região. Eles mandam uma mensagem em forma de sinal elétrico, que viaja de nervo a nervo até que alcance o seu cérebro. Então, seu cérebro processa o sinal e envia a mensagem de que você está com dor. Normalmente, o sinal para quando a causa da dor é solucionada, ou seja, quando seu corpo regenera a ferida no seu dedo ou no músculo machucado. Mas com a dor crônica, os sinais dos nervos continuam disparando mesmo depois que você esteja curado.
Sabe-se que a cronificação da dor envolve o conceito de que sua perpetuação decorre do fato de que o sintoma da dor persiste mesmo que lesão inicial já tenha sido curada. Esse conceito nos permite pensar em quais seriam os motivos que levariam alguns indivíduos a desenvolverem dor crônica e outros não.
Alguns teóricos argumentam que haveria, em algumas pessoas, uma tal exposição cerebral onde o estímulo doloroso ao persistir por mais de 90 dias, em média, induziria a alterações que os disporia à cronificação. Apesar de que exames objetivos de Ressonância Magnética Funcional ou de SPECT ainda não apontam para a existência e alterações macroestruturais que suportem essa hipótese. Nenhum sinal objetivo de atividade cerebral, em áreas relacionadas a dor, tem mostrado consistente atividade que determine quais serão os indivíduos que desenvolveram dor crônica.
Que condições causam a Dor Crônica?
Às vezes, a dor crônica pode iniciar sem nenhuma causa óbvia. Porém para muitas pessoas, ela se inicia depois de uma lesão ou devido a uma condição de saúde. Algumas das principais causas incluem:
- Lesões passadas ou cirurgia
- Problemas dorsais
- Enxaquecas ou outras dores de cabeça
- Artrite
- Nervos danificados
- Infecções
- Fibromialgia, uma condição em que as pessoas sentem dores musculares ao longo do corpo.
A dor crônica pode variar de leve a grave. Pode continuar dia após dia ou ir e vir. A dor pode ser sentida como:
- Uma dor maçante
- Latejado
- Queimando
- Um disparo
- Um espremido
- Que pica
- Ulceração
- Rigidez
As vezes a dor é apenas um de vários sintomas, que pode também incluir:
- Sentir-se muito cansado ou “exausto”
- Falta de apetite
- Distúrbios do sono
- Mudanças de humor
- Fraqueza
- Falta de energia
Dor crônica e Memória
Segundo artigo da SBED “Lembraças Dolorosas”, os estudos científicos têm mostrado é que áreas relacionadas a emoção e a motivação tornam-se mais ativadas, em alguns indivíduos, proporcionando aumento da atividade da memória. O que talvez justifique a afirmativa de que a dor ao se cronificar é um problema de memória. Com isto, se quer dizer que a dor crônica envolve um processo de aprendizagem de maneira degenerativa ou mudanças dos dos circuitaria mnêmica emocional.
Nesse sentido, a ideia é que o estímulo doloroso agudo, quando se prolonga, envolve padrões emocionais e físicos que seriam co-ativados (são ativados juntos e se relacionam), contendo sinais que foram fixados na memória (por reforçamento positivo ou negativo). Esses padrões estariam presentes mesmo na ausência do estímulo doloroso inicial. Ao serem revividos, ou relembrados, tanto de maneira consciente ou não, envolvem diferentes aspectos da memória em suas diferentes formas, seja ela cognitiva/afetiva, ou de sensações e, portanto, inconscientes.
O fato é que antigos e novos estudos sobre dor, apontam na mesma direção, lançando a hipótese de que dor crônica envolve distorções de memória sejam elas sensoriais, cognitivas ou afetivas ou todas em conjunto.
Para a TNS (Terapia Neurosensorial), a dor crônica é como uma memória mal adaptada.
Isso significa que quando as vias da dor estão funcionando corretamente, desempenham um papel de proteção. A dor nos ensina a evitar coisas ou circunstancias que podem nos ferir. É a maneira que o nosso sistema nervoso se adaptou para viver em um mundo perigoso. Pessoas que não podem sentir nenhuma dor, normalmente não vivem muito.
A dor crônica tem uma estrutura mais complexa, frequentemente combinada com estresse físico e emocional. A interação entre dor crônica e TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) é muitas vezes a causa de um tratamento terapêutico insatisfatório, às vezes, malsucedido. Por exemplo, pode ser que as memórias do trauma levem a estados de tensão que dificultam a terapia eficaz da dor. Por outro lado, a dor crônica pode ser um gatilho frequentemente não detectado da memória traumática.
A Dor Crônica afeta sua Saúde Mental
A dor crônica pode interferir na sua vida cotidiana, não deixando que você faça as coisas que deseja e que precise fazer. Ela pode afetar a sua autoestima e fazer você se sentir irritado, deprimido, ansioso e frustrado. A ligação entre suas emoções e sua dor pode criar um ciclo. Quando você está magoado, você está suscetível a se sentir deprimido. Isto pode tornar a sua dor ainda pior.
A conexão entre depressão e dor é a razão pela qual médicos, geralmente, utilizam antidepressivos como tratamento para dor crônica. Essas drogas podem ajudar tanto com a dor como com a tensão emocional. A dor também interfere no sono e aumenta seus níveis de estresse. Tanto a falta de sono como o estresse elevado podem tornar a dor ainda mais forte.
Estudo da USP publicado nesse artigo do Agência Brasil de relaciona dor crônica a casos de ansiedade e depressão em suas pesquisas encontrou as seguintes relações:
A dor crônica foi a mais comum entre os indivíduos com transtorno de humor, como depressão e bipolaridade, ocorrendo em 50% dos casos de transtornos de humor, seguidos por doenças respiratórias (33%) , doença cardiovascular (10%) , artrite (9%) e diabetes (7%).
Os distúrbios de ansiedade também são largamente associados com dor crônica (45%) e doenças respiratórias (30%) , assim como com artrite e doenças cardiovasculares (11% cada). A hipertensão foi associada a ambos em 23% dos casos.
Fibromialgia
Fibromialgia é uma síndrome que provoca dores crônicas por todo o corpo durante longos períodos, com sensibilidade nas articulações, nos músculos, tendões e em outros tecidos moles.
Esta síndrome está diretamente ligada à fadiga, distúrbios do sono, dores de cabeça, depressão e ansiedade.
Atualmente, pesquisadores acreditam que a fibromialgia é causada por um descontrole na forma como o cérebro processa os sinais de dor.
O tratamento de quadros crônicos como a fibromialgia requer tempo, dedicação, e desejo para que aconteça. A cura para o sintoma, digamos assim, existencial, não está à venda nas prateleiras, mas será estruturada e construída, caso a caso. Entender o papel que a dor ocupa na vida e nas relações, suas consequências, e ao mesmo tempo, abrir espaço para o desejo, tem impacto prático e direto na adesão dessa pessoa ao tratamento.
Não se trata apenas de um “corpo de carne” que está com dor, mas de uma pessoa, com uma história de vida, e que tem um corpo, impregnado de afeto, que está em sofrimento.
A reflexão sobre o lugar que a dor ocupa na vida da pessoa, sua relação com o corpo, e as consequências desses arranjos, possibilitam a construção de uma história única e intrasferível, ressaltando a posição subjetiva de cada pessoa em relação à dor, e como esta experiência pode limita-la em suas relações significativas na vida, como no âmbito do trabalho e da vida social. Então a dor vai além do campo físico e passa a produzir sofrimento psíquico podendo levar a um quadro depressivo
É preciso um ambiente seguro e estruturado de forma adequada para favorecer esse processo, e dar condição para que uma vida mais saudável possa ser desenvolver.
Superar a Dor Crônica é possível
Para um diagnóstico, cada caso deve ser visto individualmente por um médico especialista.
Atualmente os tratamentos mais comuns incluem usos de medicamentos analgésicos ou antidepressivos, terapias corporais (acupuntura, fisioterapia, reflexologia, massagens) e acompanhamentos psicológicos.
Terapias alternativas são um forte aliado no alivio da dor crônica. A reflexologia, por exemplo, pode ser uma boa opção para ajudar no alívio da dor crônica, uma vez que age nas terminações nervosas. (Veja mais sobre reflexologia na página da ABR – Academia Brasileira de Reflexologia).
O fato é que o tratamento que vem apresentando melhor resultado é uma combinação de vários tratamentos e mudanças no estilo de vida.
É importante que tenhamos claro que a visão de que saúde não significa ausência de doença, mas a capacidade de superar a doença (Nietzsche).
A Terapia Neurosensorial (TNS), ainda pouco conhecida no Brasil, mas com interessantes resultados na Europa, vem apresentando bons resultados. Integra conhecimentos da psicologia, fisiologia e biologia em um método chamado SomaticMemory (Memória Somática). É um método que está baseada na reorganização da memória somática localizada no que chamamos de Soma Net (Rede Somática). Uma característica essencial desse método terapêutico é que trabalhamos com sensações somáticas e movimentos para solucionar traços somáticos da experiência traumática.
O tratamento SomamicMemory está principalmente preocupado com a redução das tensões fisiológicas e emocionais. O protocolo SomaticMemory fornece um caminho de tratamento claramente estruturado e um processo interno que se segue até o profundo de suas tensões emocionais.
De acordo com o psicoterapeuta alemão Herbert Grassmann:
“O paciente de dor crônica geralmente passou por um longo caminho com vários anos sofrendo de dores, várias intervenções e procedimentos, experimentou vários médicos e instituições, recebeu muitos diagnósticos e drogas. Portadores de dor crônica frequentemente sofrem de uma variedade de distúrbios orgânicos e psicológicos adicionais, tais como distúrbios hormonais, problemas urogenitais e gastrointestinais, enfraquecimento do sistema imunológico, sentimentos depressivos, desamparo, desesperança e pensamentos suicidas. Os muitos tratamentos anteriores geralmente ajudaram pouco ou nada, muitas vezes até agravaram a dor. Pacientes com dor crônica estão, portanto, maciçamente desapontados e frequentemente patologicamente deprimidos e ansiosos. Adicional a isso, está o “insulto” de ter que visitar um psicólogo. Muito mais forte do que no tratamento do TEPT ou dos transtornos afetivos ou neuróticos, a Síndrome da Dor Crônica tem a ver com o sistema médico e suas desvantagens”.
Nesse sentido, Grassamann propõe a Terapia Neurosensorial como uma alternativa interessante para casos de dor crônica. Este método está fortemente influenciado por pesquisas neurocientificas e a prática terapêutica.
Devido ao desenvolvimento da neuropsicologia nos últimos 20 anos, ao aumento da comunicação entre as especialidades terapêuticas, um teste aprimorado, e a maturação constante do campo, o Dr. Grassamann acredita que podemos começar a fazer perguntas melhores sobre nós mesmos.